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Política

'Não somos poderosos a ponto de chutar o balde', diz Aloysio Nunes

A transferência da Embaixada do Brasil de Tel-Aviv para Jerusalém não traria ganhos na relação brasileira com Israel e tiraria o País de uma posição amparada pelo direito internacional, afirmou o ministro das Relações Exteriores, Aloysio Nunes.

Estadão Conteúdo

Publicado em 22/12/2018 às 20:07

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O ministro das Relações Exteriores, Aloysio Nunes Ferreira. / Divulgação

A transferência da Embaixada do Brasil de Tel-Aviv para Jerusalém não traria ganhos na relação brasileira com Israel e tiraria o País de uma posição amparada pelo direito internacional, afirmou o ministro das Relações Exteriores, Aloysio Nunes Ferreira em entrevista ao jornal O Estado de S. Paulo.

"Não somos um País poderoso a ponto de chutar o balde quando alguma regra internacional não nos beneficia." Após o futuro governo indicar uma nova orientação diplomática do Brasil neste assunto, o premiê de Israel, Binyamin Netanyahu, programou uma visita inédita ao País na próxima semana. O chanceler brasileiro afirmou também que a eleição de Jair Bolsonaro trará para o governo ideias como o nacionalismo e o "antiglobalismo", em contraponto com uma cultura política presente no País desde a redemocratização.

A seguir, os principais trechos:

Qual sua avaliação sobre o futuro governo anunciar a saída do acordo de migrações quando o sr. formalizava a participação do Brasil?

Em alguns temas, os interesses do país são mais eficientemente tutelados quando há cooperação com outros países. A cooperação não contradiz a soberania do País. A lei brasileira de migração foi aprovada pelo Congresso Nacional. Longe de escancarar as portas do Brasil, fixa critérios seguros para receber imigrantes A pauta do combate à imigração pode ser dos Estados Unidos, da França, da Itália, da Hungria. Mas não é pauta brasileira. O futuro presidente terá toda a latitude para propor mudança da lei e se afastar de um pacto, que não é obrigatório. Apenas acho que essa comunicação poderia esperar o dia 1.º de janeiro. Não precisava ser feito quando eu apenas descia da tribuna. Não foi um gesto cordial. 

E a saída do Acordo do Clima?

As metas do Acordo do Clima, nós propusemos. Se não conseguirmos atingir, vão invadir o Brasil? Vão replantar a vegetação do cerrado na marra? Não. Tem quem ache que o aquecimento global é uma ficção. Há gente que acredita que a humanidade nasceu de Adão e Eva. É uma crença. Mas o aquecimento global é cientificamente constatado. O Brasil se engajou voluntariamente no acordo, e fico feliz quando o futuro ministro do Meio Ambiente (Ricardo Salles), transmitindo posição do presidente Bolsonaro, diz que o Brasil se manterá no acordo. 

Esses ataques a ONU e ao multilateralismo são uma negação de pilar da diplomacia brasileira?

A eleição do presidente Bolsonaro foi triunfal, essa que é a verdade. É uma vitória incontestável, que não representa apenas a rejeição ao PT. Vejo que os valores que inspiraram sua campanha têm uma cultura política diferente daquela que predominou da redemocratização para cá. Não creio que haja risco institucional. Mas alguns valores próprios do Brasil e de uma corrente ideológica de extensão global estão presentes nessa cultura política: a desconfiança do globalismo, o fechamento, o nacionalismo. 

Isso é bom ou ruim?

É uma coisa nova, vai levar a um debate político. Espero que não bloqueie uma vertente importante do governo Bolsonaro que se anuncia, a vertente reformista. O aprofundamento do processo de reformas, colocado em andamento no governo Temer com resultados benéficos. 

Qual sua opinião sobre a mudança da Embaixada do Brasil de Tel-Aviv para Jerusalém?

Isso (a mudança da embaixada) acrescenta ao interesse nacional? Acho que não. E (a consequência negativa) não é só a questão do comércio. É uma condição de respeito do Brasil à lei internacional. É um padrão de comportamento nosso ao qual temos de nos apegar, porque não somos um País poderoso a ponto de chutar o balde quando alguma regra internacional não nos beneficia. Temo um azedume intercomunitário no Brasil. Temos comunidade árabe, judaica que convivem bem. Não quero briga da José Paulino com a 25 de Março (ruas de São Paulo). 

Se a mudança ocorrer, o Brasil pode ser alvo de terrorismo?

Não vejo isso. Mas a gente não ganha nada. E é uma pauta que nunca foi colocada para nós por autoridades israelenses. 

O sr. vê ganhos no alinhamento com os Estados Unidos?

Acho positiva a ideia de aprofundar os vínculos econômicos, culturais e tecnológicos com os Estados Unidos. Foi o que procuramos fazer. O futuro chanceler (embaixador Ernesto Araújo) conhece bem os EUA. Foi responsável pelo departamento (de EUA e Canadá, no Itamaraty). Provavelmente terá ideias melhores, mais criativas. Então, creio que dará continuidade ao trabalho. 

O futuro da relação do Brasil com a China o preocupa?

Estive com o embaixador da China (Li Jinzhang), que se despedia. Ele tinha tido uma conversa muito positiva com o presidente Bolsonaro. Não tenho maior receio. 

Estamos sendo pressionados a escolher um lado na guerra comercial entre EUA e China?

O professor (Henry) Kissinger, com quem estive em Nova York, me disse: 'Olha, vocês vão ser pressionados a tomar partido'. Acho que seremos instados a tomar partido à medida que a confrontação China-EUA adquira tonalidades mais dramáticas. Seria um erro. Não creio que o próximo governo incorra nele.

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