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Cotidiano

Papo de Domingo: 'Tenho medo que a polícia de SP fique igual a do Rio'

Cabo Wilson esteve em Santos e fez críticas à falta de valorização da Polícia Militar pelo Governo Geraldo Alckmin (PSDB)

Carlos Ratton

Publicado em 24/09/2017 às 10:30

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'É um caso excepcional e ele (policial militar)jamais poderia ter chegado ao extremo' / Divulgação

A frase é do presidente da Associação dos Cabos e Soldados do Estado de São Paulo, Wilson de Oliveira Morais, o Cabo Wilson, que esteve visitando a região para se solidarizar com as famílias dos cinco policiais militares da Baixada Santista que foram vítimas de marginais na semana passada – dois foram mortos. Ele esteve no Diário com o vereador Sérgio Santana (PR), presidente da Comissão Permanente de Prevenção, Fiscalização, Combate às Drogas e Segurança Pública da Câmara e concedeu entrevista especial para o Papo de Domingo. Confira a entrevista completa:

Diário do Litoral – Como o senhor avalia o crime passional, cometido por um policial militar, contra universitário Matheus Garcia Vasconcelos Alves?

Cabo Wilson – É triste. Eu não considero um despreparo do policial porque ele fez o curso de dois anos na PM. Foi ciúmes e ele perdeu a cabeça. É um caso excepcional e ele jamais poderia ter chegado ao extremo. Policial não é treinado para matar, mas para salvar vidas. Só em legítima defesa é que o policial pode chegar ao extremo. Ou é o policial ou o marginal. A PM é rígida nesses casos, não admite situações como essa e ele já está preso e, consequentemente, será expulso.

Diário – A Polícia já encontrou vestígios de uso de armamento particular na execução. É comum policiais usarem armas próprias fora do horário de trabalho?

Cabo Wilson – É permitido desde que a arma seja registrada e comprada legalmente. Cada policial pode ter duas armas, além da fornecida pela corporação. Se não for registrada, é crime por porte ilegal. A perícia está definindo qual o tipo da arma, mas se ele usou uma arma própria legal ou uma ilegal, estava totalmente errado, pois não é uma atitude de um policial que defende a sociedade arriscando a própria vida.

Diário – É cada vez mais necessário o policial ter armas particulares?

Cabo Wilson – Sim. Tem setores da PM que exige a devolução da arma oficial após o trabalho e hoje a bandidagem possui armas cada vez mais sofisticadas. O policial precisa ter a sua para se proteger, pois ele é visado. Os bandidos nunca agem sozinhos. Por isso, ele precisa estar preparado. A maioria dos policiais usa duas armas, a da corporação e sua própria regularizada.

Diário – É preciso justificar o uso nos dois casos?

Cabo Wilson – Não porque ambas são legais e podem ser utilizadas desde que no cumprimento da lei.

Diário – A pistola automática P.40 Taurus, usada pela PM, é realmente insegura?

Cabo Wilson – Sim, é verdade. O Governo do Estado abriu licitação para adquirir novo armamento, talvez a 9 milímetros, muito utilizada pelo Exército, Marinha e Aeronáutica.

Diário – O senhor é a favor de ampliar os conhecimentos de Direitos Humanos aos policiais?

Cabo Wilson – Já existe esse curso nas escolas de formação de soldados, de sargentos e de oficiais. Não vejo necessidade de ampliar os cursos nessa área. Direitos humanos é para todos os cidadãos mas, infelizmente, na prática, os simpatizantes defendem mais marginais do que policiais. Dos cinco policiais que foram vítimas, nenhum ativista foi visitar os sobreviventes no hospital e suas famílias. O correto é defender todos.

Diário – O senhor acredita que os concursos da PM deveriam ser mais rigorosos?

Cabo Wilson – Quanto melhor a seleção, melhor o policial. A Associação defende que para ingressar na PM é preciso curso superior, mas esses candidatos não se habilitam porque ninguém quer ingressar numa profissão que registra mais de 100 mortes por ano, para ganhar R$ 2.992,00 por mês. Essa é a realidade. Atualmente, o candidato ingressa somente com o ensino médio completo e, após se formar, recebe o certificado da Escola Superior de Polícia, que equivale ao Ensino Superior.

Diário – O Estado de São Paulo não poderia pagar um salário melhor?

Cabo Wilson – Mais digno, com certeza. Estamos no estado mais rico da nação e em 25º no quesito salário. Só ganhamos do Rio de Janeiro e Espírito Santo em termos de salário. No Distrito Federal, o policial militar ganha R$ 6 mil. Roraima paga R$ 4,8 mil e Minas Gerais mais de quatro mil. O salário é indigno e não faz jus ao preparo dos policiais militares paulistas.

Diário – Isso justifica os ‘bicos’?

Cabo Wilson – Cerca de 85% fazem bico. Somente três mil dos 84 mil policiais em todo Estado trabalham no bico oficial (Operação Delegada). Ou seja, 81 mil fazem bicos clandestinos. O policial deveria ter salário digno para manter sua família.

Diário – O senhor concorda que a PM discrimina a pessoa pela cor da pele, gosto e maneira de se vestir, por exemplo?

Cabo Wilson – Não há preconceito, pois existem muitos marginais de paletó e gravata. Geralmente, o policial conhece a malandragem pela maneira que ele se expressa, que ele reage ao ser encarado. A Polícia não aborda só negros, pois 40% da polícia paulista é formada por negros. Pessoas com tatuagens são abordadas quando o desenho remete a uma facção criminosa. Nem sempre 100% das abordagens são perfeitas porque o ser humano, apesar de preparado, comete erros. Um médico, um advogado e um jornalista também os comete. A repercussão sobre a morte do universitário foi grande, mas ninguém repercute que a PM paulista está prendendo cerca de 10 mil marginais por mês em flagrante delito ou após o crime.  

Diário – Mas prender não é obrigação? Particularmente, existe preconceito com relação ao trabalho dos jornalistas?

Cabo Wilson – A PM vê o jornalista como uma pessoa de bem. Que elogia quando necessário e critica também. A categoria tem muito respeito pelo jornalismo, tanto que a Associação tem assessoria de Imprensa com profissionais formados. No entanto, como existem maus policiais, também existem maus jornalistas, como qualquer profissão. A Polícia não pode ser julgada por um ato isolado.

Diário – Como o senhor avalia a recente postagem de um policial que se sentiu perseguido por ser homossexual?

Cabo Wilson – Não existe discriminação e nenhuma norma que impeça o ingresso de homossexuais na PM. O policial tem a opção e a vida particular assegurada. No entanto, a rigidez da Corporação não permite algumas atitudes e posturas. Existem homossexuais na PM e a Associação os defende igualmente aos heterossexuais.

Diário – Se o senhor pudesse ter uma conversa com o governador Geraldo Alckmin, o que pediria para melhorar a PM paulista?

Cabo Wilson – Somos a polícia mais ordeira. Nunca fizemos greve porque respeitamos a sociedade. Não por medo do regulamento, do governador ou da Constituição. Quando a fome bate na barriga, não tem nada que segure. Infelizmente, o governador e o governo PSDB não reconhecem o esforço da polícia militar. Não valoriza. Estamos cada vez ganhando menos. Vai chegar um momento que nossa polícia pode virar igual a do Rio de Janeiro. Tenho medo que a polícia de São Paulo fique igual a do Rio. Estão querendo sucatear a polícia do Estado. Eu pediria a ele para olhar o homem e não só a máquina. Para melhorar os salários – estamos três anos sem reajuste - e construir habitações em locais apropriados, pois tem policial que mora em cortiços. A Associação já construiu seis mil moradias, inclusive em Praia Grande, e o Estado nenhuma. O policial precisa de tudo isso e uma assistência médica decente para que ele seja incorruptível. Temos um governador que possui a melhor polícia do Brasil, mas não a valoriza.

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